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Imigração Alemã no Rio Grande do Sul

     Antes de começar a falar sobre a imigração no Rio Grande do Sul cabe relembrar: além da população nativa do território (indígenas) e dos colonizadores portugueses, não podemos esquecer dos milhares de escravos africanos, migrantes forçados trazidos pelo tráfico transatlântico. Ou seja, a imigração não começou no século XIX para o sul do Brasil! O que iniciou nessa época foi a imigração enquanto iniciativa do Império por diversos motivos - para cada região do Brasil haviam motivos específicos. Dito isso, vamos tratar um pouco sobre a imigração alemã no atual território do Rio Grande do Sul.

     Antes de 1870, não existia um país chamado "Alemanha". O processo de formação do Estado nacional alemão causou a eliminação das terras comunais, a desarticulação do trabalho artesanal, gerando uma grande tensão social com muitos sem-terra e desempregados. A solução, para muitos, era a emigração e as opções mais escolhidas foram os Estados Unidos (para a maioria), o sul do Brasil, a Argentina e o Chile.

     E quais foram as motivações para a imigração? Para os europeus, a proposta era interessante por aliviar a tensão social causada pela industrialização e mecanização da produção. Para o Império brasileiro, serviria  para o abastecimento de recursos materiais (alimentos) e de recursos humanos (novos soldados para os combates na região da Bacia do Prata).

     1ª etapa (1824-1845)

     Foi a fase mais difícil para quem veio para o Brasil, conhecida com a fase de subsistência. Além da dificuldade para pagar a "dívida colonial" referente à viagem para o Brasil e o estabelecimento nas novas terras, os alemães tiveram de enfrentar conflitos com os indígenas que habitavam as terras, a Guerra da Cisplatina e a Revolta dos Farrapos. Em 1830, a lei orçamentária do Império não previa mais recursos para a imigração, dificultando ainda mais difícil a vida dos recém-chegados. 

Estação de Taquara em seus primeiros anos
     Mesmo com as dificuldades, os imigrantes dessa primeira etapa estabeleceram suas colônias em São Leopoldo, Campo dos Bugres (atual Caxias do Sul), Montenegro e Taquara.






São Leopoldo, 1824

2ª etapa (1845-1870)

     Foi a fase da expansão do comércio. Após se estabeleceram e iniciarem o processo agrícola, a produção de excedentes deu início às trocas comerciais - surge a figura do comerciante de origem alemã. Como somente ele possuía os meios de transporte (mulas e barcos) para elvar a produção até Porto Alegre, pagava muito pouco aos colonos e vendia a bons preços na capital da província. Nessa fase, os imigrantes estabeleceram suas colônias em Feliz, Bom Princípio, Estrela, Lajeado, Santa Cruz do Sul, Venâncio Aires e São Lourenço do Sul.
Família Winter, de Bom Princípio
[Imigraçao+escola.jpg]
Escola em Estrela - RS
Família Jacobsen, de Venâncio Aires

Escola de Picada Moinho, em São Lourenço do Sul

3ª etapa (1870 em diante)

    Fase do desenvolvimento da industrialização. A acumulação de capital dos comerciantes permitiu investimentos no setor industrial: cervejarias, fábricas de calçados, olarias, curtumes e construção naval. Surgem, nessa época algumas das principais "dinastias" familiares de origem germânica: Ritter, Renner, Mentz, Dreher, Sperb, Vontobel, Gerdau... Lembra dessas marcas? São de famílias alemãs.




     Houve imigrantes alemães que, diferente da grande maioria, trouxeram consigo capitais para investir, mas eram industriais de menor cacife financeiro - os mais ricos foram para São Paulo e Rio de Janeiro. Foram eles os Rheingantz (1874, Rio Grande, indústria têxtil) e os Neugebauer (1891, Porto Alegre, fábrica de doces e balas). A diferença entre as indústria gaúcha e paulista era que a indústria gaúcha tinha capital proveniente do mercado interno, enquanto na indústria paulista prevaleciam as ligações com o mercado externo - principalmente pelo café. A arrancada industrial se deu ao mesmo tempo no Rio Grande do Sul e em São Paulo, porém, a diferença de capital entre os industriais daqui e do centro do país eram muito grande. Os mais ricos estavam (e estão, até hoje) em São Paulo.


          A grande maioria da comunidade alemã continuou sendo de colonos agricultores, submetidos a grandes dificuldades: precariedade técnica, pouca renda, fracionamento de heranças dos lotes coloniais que já não eram muito grandes - o que causou o êxodo rural em direção ao planalto.

     O desenvolvimento dos imigrantes não foi acompanhado de uma efetiva participação política, a não ser nas Câmaras Municipais nos municípios de colonização alemã.

     Somente em 1881, com a Lei Saraiva, os não-católicos e estrangeiros naturalizados tiveram direto a voto. Isso beneficiou os alemães que eram, em sua grande maioria, protestantes. Essa lei não valia, no entanto, para os italianos recém-chegados.

     Abaixo, para efeitos de comparação, segue um levantamento do IBGE sobre a chegada de alemães ao Brasil. Para o Rio Grande do Sul interessam basicamente os dados do século XIX que foi quando a imigração teve como destino o sul do país.


Comentários

  1. Pena que na 2ª Etapa (1845-1870), não lembraram de incluir a Colônia Santo Ângelo, Distrito de Cachoeira do Sul/RS (hoje Agudo, Restinga Seca, Nova Palma, Dona Francisca, Paraíso do Sul e Cerro Branco), onde os primeiros imigrantes alemães chegaram em 1º de novembro de 1857!!!

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  2. A Colonia de Santo Angelo foi esquecida desta pesquisa da qual faz parte minha cidade , onde a comunidade de origem alemã supera os 50% da população.

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