Avenida Nove de Julho, Buenos Aires, na década de 1930. |
Para entender a ditadura argentina e mesmo a atual conjuntura política do país, vamos voltar um pouco no passado e entender a expressão política de Juán Domingos Perón.
Conjuntura política
O movimento peronista surgiu num contexto nacional marcado por mudanças nas condições do desenvolvimento econômico. Com a crise mundial de 1929 os países desenvolvidos - compradores de produtos primários - adotaram medidas de corte protecionista, e a Argentina enfrentou dificuldades para colocar seus produtos tradicionais (carnes e cereais), no mercado internacional. Este fato gerou condições para um virtual crescimento interno, propiciando o desenvolvimento da indústria leve. Porém, este processo de lenta industrialização gerou graves tensões com a burguesia agrária, que detinha o poder econômico no país. As oligarquias fundiárias locais haviam organizado um Estado centrado em seus interesses articulado pelo liberalismo econômico.
Nesse contexto, governos de caráter popular como o de Hipólito Yrigoyen (1916-1922 e 1928-1929), que possibilitava maior acesso da classe média ao poder político, eram atacados pela oligarquia tradicional. Embora seja caracterizado como um governo nacionalista e popular, Yrigoyen não produziu mudanças na estrutura econômica do país e o poder, na prática, seguia sob controle dos grandes proprietários e setores ligados à exportação de carne (frigoríficos ingleses e estadunidenses). Em 1929, Yrigoyen teve de enfrentar a forte crise econômica e social enquanto assistia o reagrupamento dos grupos conservadores, que abandonaram o projeto liberal e tomaram posições próximas ao fascismo europeu em ascensão.
Em 1930, um golpe militar, com o apoio dos EUA (o que já não deve causar espanto a ninguém!), levava ao poder o General José Uriburu (ex-deputado conservador).
Na década de 1940, o poder da oligarquia agrária passou a ser questionado pelas camadas médias, cujos interesses não eram contemplados. A decadência do projeto das elites agrárias somados aos problemas de incorporação à ordem capitalista internacional desencadearam a crise que culminou com um novo golpe militar, em 1943, encabeçado pelo General Pedro Ramírez, ministro de Guerra. Foi então que Juán Domingos Perón passou a atuar na política argentina. Assumindo o posto de chefe da Secretaria do Trabalho, Perón ampliou os direitos trabalhistas e ampliou a organização sindical colocando-se cada vez mais próximo dos trabalhadores e mais longe dos militares. Sobre a questão sindical, é interessante destacar que boa parte dos trabalhadores não tinha nenhum sindicato de classe para defender seus direitos e a ampliação promovida por Perón garantiu maior acesso à luta pelas causas trabalhistas. Além disso, Perón conseguiu cooptar alguns líderes do antigo sindicalismo e os novos sindicatos surgidos com a diversificação da economia conquistando, em 1945, uma classe trabalhadora quase totalmente peronista.
A popularidade estrondosa de Perón desencadeou desconforto e mal-estar junto a seus colegas das Forças Armadas, levando o Presidente da República a afastá-lo da Secretaria do Trabalho, decretando sua prisão. questioná-la. Mas o movimento operário organizou uma mobilização surpreendente para a época, proclamando seu retorno. E o governo, frente às pressões, resolveu libertar Perón, e permitiu sua participação nas eleições controladas pelo exército. Assim, 17 de outubro de 1945 ficou conhecido como a data de nascimento do peronismo político. No ano seguinte, Perón foi eleito presidente com 49% dos votos.
No poder, Perón, pressionado pelas demandas de sua base social confrontou-se com as organizações dos proprietários mais poderosos do país. Este enfrentamento se manifestou em seus métodos dirigistas na área econômico-social: aplicou uma política de controle de preços, de salários, dos bancos e do câmbio, visando transferir a renda dos setores agropecuários e industriais mais importantes para os assalariados e à classe média. O projeto peronista caracterizou-se pela distribuição da renda, porém não afetou significativamente as bases econômicas dos interesses tradicionais da sociedade argentina.
Com efeito, Perón, figura carismática, de liderança indiscutível, ganhou um vasto número de seguidores de origem heterogênea: operários, forças armadas, parte da classe média e setores da burguesia estatal e da nova burguesia industrial, contribuíram para a construção da nova doutrina social, fundado na fidelidade e obediência ao regime militarista implementado por ele (num sistema hierárquico centralizador).
Perón, Vargas e Cárdenas: aproximações e diferenças
Getúlio Vargas / Juán Perón / Lázaro Cárdenas |
Mas, Vargas não foi a única "inspiração" de Perón. Lázaro Cárdenas, presidente do México de 1936 a 1940 também "ensinou" o argentino. Poderia citar a defesa de uma política centrada na “justiça social”, apoiada na democracia caracterizada pela “melhor distribuição da riqueza”. Outro elemento comum é a denuncia das “oligarquias” e das forças econômicas estrangeiras, que tentavam dominar o Estado. Da mesma forma que o presidente mexicano, Perón procurou a “unidade” das classes operárias e definir um governo que fosse o “árbitro e regulador da vida social”.
Perón próximo do fascismo europeu?
Dizem que o Perón também seguiu algumas premissas do fascismo. É vero? É mais adequado apontar os empréstimos e adaptações que o regime peronista fez dos modelos europeus, do que falar simplesmente de um fascismo argentino.
Entre as diferenças podemos citar que a base social do peronismo estava nas camadas populares e não na classe média como ocorrera no fascismo. Do ponto de vista ideológico, o fascismo foi uma experiência “totalitária”, enquanto a peronista foi “mediadora”. Além disso, o fascismo possuía uma estrutura ideológica muito mais definida.
Porém, não é só a semelhança dos livros infantis (figura ao lado) que indicam proximidades entre o peronismo e o fascismo. Ambos viam a necessidade da construção de um novo Estado com uma nova classe dirigente (daí o forte investimento na juventude), uma nova consciência e na busca de uma nova cultura.
Ambos os regimes jogavam a culpa pelo atraso econômico nos governos liberais e na classe política dominante, que não sabia coordenar os recursos produtivos do país e garantir a aceleração do desenvolvimento. Deste modo, a nascente ideologia da industrialização era acompanhada por projetos visando reorganizar o Estado e mobilizar as massas. Todavia, ambos propunham uma política que era chamada de terceira via entre capitalismo e comunismo, como resposta à crise da sociedade contemporânea. Portanto, é equivocado dizer que o fascismo ou o peronismo alinharam-se com o capitalismo ou com o comunismo. No máximo, como dizem nosso avós, "flertavam" com um ou com outro, num relacionamento aberto.
Na próxima postagem, vou tratar especificamente sobre o governo de Perón, suas ações, suas quedas, suas voltas, seus amores... não caberia tudo numa só postagem!
Entre as diferenças podemos citar que a base social do peronismo estava nas camadas populares e não na classe média como ocorrera no fascismo. Do ponto de vista ideológico, o fascismo foi uma experiência “totalitária”, enquanto a peronista foi “mediadora”. Além disso, o fascismo possuía uma estrutura ideológica muito mais definida.
Porém, não é só a semelhança dos livros infantis (figura ao lado) que indicam proximidades entre o peronismo e o fascismo. Ambos viam a necessidade da construção de um novo Estado com uma nova classe dirigente (daí o forte investimento na juventude), uma nova consciência e na busca de uma nova cultura.
Ambos os regimes jogavam a culpa pelo atraso econômico nos governos liberais e na classe política dominante, que não sabia coordenar os recursos produtivos do país e garantir a aceleração do desenvolvimento. Deste modo, a nascente ideologia da industrialização era acompanhada por projetos visando reorganizar o Estado e mobilizar as massas. Todavia, ambos propunham uma política que era chamada de terceira via entre capitalismo e comunismo, como resposta à crise da sociedade contemporânea. Portanto, é equivocado dizer que o fascismo ou o peronismo alinharam-se com o capitalismo ou com o comunismo. No máximo, como dizem nosso avós, "flertavam" com um ou com outro, num relacionamento aberto.
Na próxima postagem, vou tratar especificamente sobre o governo de Perón, suas ações, suas quedas, suas voltas, seus amores... não caberia tudo numa só postagem!
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