Pular para o conteúdo principal

O Rio Grande do Sul durante a Primeira República

     Antes de mais nada, um esclarecimento: não uso aqui o termo "República Velha" pois concordo com a visão atual da historiografia de que o termo é pejorativo. Utilizo o termo "Primeira República" por apresentar-se como a fase inicial da República brasileira, sem recorrer a detratações.

Templo Positivista da Av. João Pessoa, Porto Alegre - RS
     Com a proclamação da República (1889), subiu ao poder no estado o Partido Republicano Rio-grandense (PRR) formado por indivíduos oriundos do latifúndio pecuarista e setores médios urbanos. O PRR adotou o Positivismo como ideologia, mas de maneira não ortodoxa. A concepção original do positivismo tinha uma visão progressista e conservadora ao mesmo tempo: pregava a aceleração do desenvolvimento industrial, mas sem alterações sociais - rico continua rico e pobre continua pobre, em síntese. No contexto gaúcho, a adaptação do ideário positivista permitiu a implantação de um projeto capitalista com modernização econômica (em especial no setor dos transportes) e a ampliação da base política do governo - alianças com as "classes médias" e com os grupos da região da colonização.

     No Rio Grande do Sul, a implantação da República implicou na adoção de um governo autoritário, fortemente centralizado na figura do chefe político. Isso pode ser notado nas características da Constituição Estadual de 1891, elaborada pessoalmente por Júlio de Castilhos:

  • Poder Legislativo estadual limitado a questões orçamentárias;
  • Poder Executivo forte, com a utilização de decretos que tinham valor de lei;
  • possibilidade de reeleição ilimitada do presidente estadual.
     A tomada do poder pelos republicanos, no entanto, não se deu sem contestação. O novo governo teve de enfrentar a Revolução Federalista (1893-95). A revolta da oposição tinha ex-liberais, ex-conservadores e até alguns republicanos dissidentes. Enquanto os republicanos eram liderados por Júlio de Castilhos, reunidos no PRR, os federalistas tinham Gaspar Silveira Martins como líder.

     A Revolução Federalista, em resumo, foi uma revolta de coronéis e representantes do poder local contra a ação política de Júlio de Castilhos. Com a subida dos republicanos ao poder, o pacto imperial foi rompido. O "pacto" dos coronéis com o Império funcionava assim: os coronéis da fronteira defendiam os interesses territoriais imperiais e, em troca, o governo fazia "vistas grossas ao contrabando. Os republicanos prejudicaram esse "pacto" rompendo com tais privilégios.

     Tínhamos dois grupos em confronto. Os federalistas defendiam a volta da monarquia e o parlamentarismo. Os republicanos defendiam o presidencialismo e, óbvio, a República!

     A Revolução Federalista veio a se constituir num marco divisório do tipo de coronelismo do Rio Grande do Sul. Na época do Império, os coronéis liberais tinham ampla autonomia de ação em troca de votos. Com a tomada do poder pelos republicanos, sua autonomia foi restringida, o contrabando foi efetivamente combatido e taxas alfandegárias privilegiadas foram extintas.

     As principais consequências dessa revolta coronelista foram a consolidação do grupo republicano no poder (Júlio de Castilhos e, depois, Borges de Medeiros) e uma nova configuração da base social de apoio ao governo, visto que os coronéis acabaram se dobrando ao peso do poder dos republicanos.

Comentários

Postar um comentário

Comente a vontade... e com respeito, claro!

Postagens mais visitadas deste blog

Povoamento Inicial do Rio Grande do Sul: a Colonização Açoriana

Antes, um parêntese sobre o processo de apropriação de terras       As terras eram concedidas por meio de sesmarias e datas, que eram porções do território entregues pela Coroa aos súditos com a obrigação de povoar e cultivar a terra. Esse sistema, já vigente em Portugal desde 1375, foi estendido às colônias ultramarinas visando garantir o povoamento do território e a delimitação das fronteiras. Foi a partir de 1750 que ocorreu uma certa intensificação das concessões. Aqui no Continente de São Pedro (Rio Grande do Sul colonial) o povoamento geral intensificou-se após 1764. Foi nesse ano que o Cel. José Custódio de Sá e Faria assumiu o governo do Continente com árduas tarefas: estabelecer os açorianos, cumprir a entrega das concessões prometidas, controlar os índios, eliminar a escravidão indígena, capacitar as defesas (construção de fortins no rio Taquari) e fomentar a agricultura (incentivo ao cultivo de trigo e de linho-cânhamo). Devido à invasão espanhola à...

A Direita na Europa

Se a América Latina tem seguido o rumo a esquerda, a Europa vai à direita. É o que se tem observado com o crescimento dos partidos de direita no Velho Mundo. Em postagem recente, trabalhei os conceitos de esquerda e direita e, sim, eles existem hoje e são perceptíveis. É verdade que a direita na Europa tem procurado se "modernizar" para conquistar a maioria dos eleitores. E, com a crise econômica mundial de 2008, houve a consolidação dessa tendência de "direitização europeia". Isso já ocorreu na crise de 1929, quando os governos de direita ganharam força depois da crise com Hitler na Alemanha e Mussolini na Itália, por exemplo. Calma, isso não quer dizer que a Europa esteja a beira de u m novo nazismo. Não é para tanto! Mas a crise faz com que o eleitorado opte por governos tradicionais, conservadores, com os quais saibam que não haverá mudanças de rumos e tudo seguirá como está e talvez até melhore. De acordo com o escritor e jornalista Álvaro Vargas Llosa, "a...

Guerra da Cisplatina

     Quem tem acompanhado a série de postagens sobre a história do Rio Grande do Sul já deve ter notado que é impossível entendê-la dissociada do contexto da Bacia do Prata. É inegável a ligação da região - que hoje equivalem ao Uruguai e a Argentina - à formação histórica do RS. O próprio personagem do gaúcho tradicionalista é um misto de argentino, uruguaio, índio, negro, português e espanhol - não necessariamente nessa ordem. Ou seja, o gaúcho é fruto de toda essa "mistura" cultural, social, étnica e política.      A situação já tumultuada da região ficou mais intensa após a transferência da Corte portuguesa para o Brasil, em 1808. Com a família real no Brasil, a metrópole interiorizou-se na colônia, promovendo maior centralização do poder decisório e acentuou-se a atração exercida pela região da Cisplatina. Antes de mais nada, vamos comparar o território do Brasil de 1709 com o Brasil de 1821, nos mapas abaixo: 1709 ...