Os atos de vandalismo e a repressão policial
Antes de tudo, quem praticava vandalismo nas manifestações era uma minoria de pessoas e os que aproveitaram-se da situação para saquear lojas são bandidos (não eram manifestantes!).
O vandalismo só está sendo citado aqui porque aconteceu mas não considero-os como parte das manifestações por ser atitude de poucos. Mas ele precisa ser compreendido no seu caráter contestatório, como exposição aguda da insatisfação popular. É um ato impulsivo, não racional, pois quando depredamos o patrimônio público, os maiores prejudicados somos nós mesmos pois o valor das reparações será retirado do valor pago pela população em impostos.
Porém, não podemos cair no pensamento fortemente disseminado pela mídia (principalmente nas primeiras manifestações) de que manifestante é baderneiro. Alto lá, cara pálida! Manifestante é manifestante. Baderneiro é baderneiro. Ponto final. Qualquer discurso diferente disso é manipulação.
Outra marca forte dos protestos, principalmente os primeiros, foi a forte repressão policial sem uma justificativa plausível - muitas agressões foram gratuitas. O papel de qualquer polícia em uma democracia é defender a população e o patrimônio público (de preferência nessa ordem) e nunca colocar-se contra qualquer manifestação pacífica.
Por uma democracia de verdade
A participação popular em democracias representativas como a nossa se dá apenas pelas urnas. Ou seja, nossa intervenção nos destinos do país ocorrem, efetivamente, a cada dois anos quando ocorrem eleições. Assim, escolhemos na urnas quem nos representará em nossas decisões políticas, das quais abrimos mão para deixar aos cuidados de nossos eleitos. Ocorre que são pouquíssimas as pessoas que acompanham os projetos de lei apresentados, como tem se comportado e que decisões tem apoiado ou rejeitado o parlamentar ou governante em quem votou. Assim, a democracia representativa que, na minha opinião, já é bastante inócua, torna-se ainda menos efetiva. As manifestações podem ter exigido maior participação popular nas decisões políticas (como a utilização mais frequente de referendo e plebiscitos) mas isso ainda não altera a base de nossa democracia que precisa ir além buscando meios efetivos de intervenção dos cidadãos.
O atual modelo de democracia sem efetiva participação popular é própria do sistema capitalista que acaba fundindo os conceitos de cidadão com o de consumidor. Explico: o senso comum atual é de que precisamos lutar pelos nossos direitos não porque eles são inerentes a nossa condição de cidadãos mas porque pagamos impostos, ou seja, "eu paguei, quero um serviço de qualidade" na visão mais costumeira de um consumidor. Não percebe-se uma luta pelos direitos visando uma sociedade onde todos tenham acesso ao que garante nossa Constituição, mas uma marcha de consumidores insatisfeitos com a prestação de serviços. Isso não tira a legitimidade das manifestações mas desloca o foco do real problema.
O atual modelo de democracia sem efetiva participação popular é própria do sistema capitalista que acaba fundindo os conceitos de cidadão com o de consumidor. Explico: o senso comum atual é de que precisamos lutar pelos nossos direitos não porque eles são inerentes a nossa condição de cidadãos mas porque pagamos impostos, ou seja, "eu paguei, quero um serviço de qualidade" na visão mais costumeira de um consumidor. Não percebe-se uma luta pelos direitos visando uma sociedade onde todos tenham acesso ao que garante nossa Constituição, mas uma marcha de consumidores insatisfeitos com a prestação de serviços. Isso não tira a legitimidade das manifestações mas desloca o foco do real problema.
E o Gigante voltou a dormir...
Sou totalmente a favor de qualquer manifestação política pois defendo sempre a livre expressão que só é possível em uma democracia - mesmo a pior das democracia é preferível do que a melhor das ditaduras. Porém, não percebi nas manifestações um desejo sincero de mudança ou uma real compreensão por grande parte da população sobre o real significado delas. Passadas algumas semanas, notamos que boa parte dos que estavam nas ruas foram lá por "modinha", para postas a foto nas redes sociais e entrar no clima do momento. As redes sociais, apontadas como grandes fomentadoras de manifestações do outro lado do Atlântico, parecem ter sido muito mais espaço de discussão sobre a legitimidade dos protestos e para acrescentar mais fotos aos álbuns de seus usuários do que efetivamente como espaço para fomentar um debate para a construção de um novo país.
O título da postagem já indica minha falta de esperança com relação a efetivas mudanças futuras sem uma discussão real do problema. Vou tomar apenas um fato: a conquista na redução das passagens no transporte coletivo. Ok, uma vitória garantida a partir dos protestos. Mas, alguém analisou a fundo de onde saiu essa redução e quem vai pagar por isso? As reduções (falo aqui especificamente do caso de Porto Alegre que conheço melhor) vieram por desoneração de impostos por parte dos governos municipal, estadual e federal. A isenção ou redução na cobrança de tais impostos impactou na redução do valor da passagem. Mas, e os empresários das empresas de transporte? Qual o impacto para eles e no lucro de seus empresas? Nenhum. Os empresários continuarão exatamente com o mesmo lucro pois quem abriu mão da arrecadação foi o governo e não o empresariado. Assim, só quem saiu perdendo fomos nós, cidadãos, que teremos menor valor para ser aplicado em saúde, educação, segurança... Ou seja, a conquista ocorreu mas a base do problema não está resolvido.
Na minha humilde opinião, as manifestações ocorreram em 2013 e não antes porque estamos sentindo mais intensamente hoje as consequências de um projeto político adotado em nosso país que tenta harmonizar um projeto de maior inclusão social dentro das premissas do Capitalismo. Ou seja, tenta-se minimizar a selvageria do sistema sem abrir mão de suas premissas básicas. Mais cedo ou mais tarde, esse tentativa de juntar água e azeite desandaria. Foi o que aconteceu. O remendo não tem mais sido suficiente para tapar o buraco. Por exemplo, reduzir o IPI de automóveis para estimular o consumo (e enriquecer os empresários) acaba superlotando as vias públicas de carros e, em contrapartida, não há mudanças na mobilidade urbana nem preocupação com os impactos ambientais e climáticos que tal decisão gera a médio e longo prazo.
O objetivo dessas duas postagens não foi dar respostas mas fomentar a discussão. Eu acredito que o ENEM e os Vestibulares devem trazer para a prova de redação temas que tangenciam as manifestações, por isso, busquei colocar aqui alguns argumentos, pensamentos e reflexões na tentativa de acrescentar ideias para o seu texto. Não pretendi esgotar aqui os assuntos em torno dos recentes protestos pois, na minha opinião, a discussão poderia gerar dezenas de postagens mas não é essa a pretensão desse blog. Fico a disposição para sugestões, dúvidas, críticas e a todo tipo de manifestação.
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