Em 2011, escrevi um texto para meus alunos para finalizar a temática do Absolutismo e encerrar meu estágio. O título era: NÃO SE MUDA O MUNDO OLHANDO PELA JANELA. Dois anos se passaram e, se naquela época, os protestos contra a passagem de ônibus em Porto Alegre reuniam umas 500 pessoas, em 2013, chegaram à marca de 11 mil pessoas. Ok. E o que mudou de lá pra cá? Deixo essa resposta pro final embora, aviso desde já, é a minha visão a respeito. Antes, prefiro esclarecer alguns pontos.
Os protestos eram contra o quê ou contra quem?
Digamos que o estopim das manifestações foi o novo aumento de passagens (o reajuste anual) mas, não, não era só por causa dos R$ 0,20 ou R$ 0,10 ou R$ 0,05. Protestos contra o aumento de passagens já ocorriam há anos mas com pouquíssima participação popular nas manifestações. Em 2013, uma série de reivindicações foram incorporadas aos protestos: por maior investimento em saúde e educação, contra os altos gastos com a Copa, por uma reforma política, contra a PEC 37... A questão é que quando 10 mil pessoas estão nas ruas protestando não há como determinar aquela manifestação como sendo por uma causa única. Uns podem dizer que o povo cansou de ser explorado ou que a luta era por mais direitos. Na minha humilde opinião, cada um criou seu cartaz e foi para a rua defender a sua causa mas quem começou essa luta foram, essencialmente, os estudantes indignados com o aumento anual das passagens que sempre beneficiaram muito mais os empresários do setor do que o transporte público como um todo. E quem quis, aproveitou, foi pra rua e externou, também, sua indignação pessoal.
Mas, em síntese, os protestos não eram contra alguém específico (embora tenham ocorridos manifestos específicos contra prefeitos e governadores nos últimos meses) mas contra o poder estabelecido e a forma de governar. Poderíamos dizer que os protestos eram contra "o sistema". Como nenhum novo projeto ou sistema era apresentado, diria que o povo foi para as ruas para pedir um capitalismo menos selvagem que agrida menos os direitos individuais e permita que a maioria usufrua dos benefícios advindos dos serviços públicos. Ou seja, em vez de manter o modelo atual de centralização dos lucros e socialização das perdas a luta seria pelo maior acesso e qualidade dos serviços públicos sem que ninguém lucre excessivamente com isso.
E a corrupção?
Eu acho exageradamente simplista dizer que os protestos eram contra a corrupção. Se analisarmos friamente, casos de corrupção no Brasil ocorrem há, pelo menos, 513 anos e eles não são exclusividade de terras tupiniquins. Nos EUA, potência capitalista mundial, há deputados condenados por corrupção que continuam com seu mandato no Congresso usufruindo de todos os benefícios de seus colegas. Aí, alguém vai dizer: mas nunca roubou-se tanto na história desse país! Será? Ou isso seria reflexo da atual liberdade de imprensa livre que pode denunciar os casos de corrupção (embora denuncie apenas aqueles que lhe convém...)? Só para citar um exemplo, a construção da rodovia Transamazônica projetada e construída durante a ditadura civil-militar (1964-85) gastou 20 vezes mais do que o previsto. Foi erro nos cálculos dos responsáveis pela obra ou a rodovia (que segue até hoje sem grande utilidade) foi criada só para desviar dinheiro? Se tivéssemos uma imprensa livre na época talvez o povo ficasse sabendo de um dos maiores rombos nos cofres públicos de nossa história - algo que hoje, com a abertura dos arquivos que restaram da época, possamos saber com certeza.
Com isso quero dizer que discordo dessa tese intencionalmente plantada para resumir todos os problemas do Brasil à corrupção. Isso acaba só impedindo um debate sério sobre os reais problemas - como, por exemplo, a melhoria do transporte público em detrimento ao massivo investimento em estradas para escoar mais e mais carros que só enriquecem as grandes indústrias automobilísticas... Aí a pessoa tenta falar sobre por que não se investe mais em transporte público e a mídia grita: "Mas os políticos só querem roubar mesmo." Pronto. A discussão acaba, não evolui. Mas não é tão simples assim.
Além disso, deveríamos deixar de lado a hipocrisia e assumir que não só os políticos são corruptos...
Uma manifestação sem partidos. Será?
Em Porto Alegre, os movimentos contra o aumento de passagens sempre foram encabeçados pelos Diretórios de Estudantes que, em geral, abrigam jovens engajados nas alas jovens de partidos como o PSTU e o PSOL. Com certeza, foram esses jovens ligados a algum partido político que iniciaram as manifestações há alguns anos. E qual o problema nisso? Eu, sinceramente, não vejo nenhum. O problema está no "pré-conceito" que temos quanto ao fisiologismo dos partidos que não está de todo errado mas que conta com um certo exagero disseminado pela mídia. Os partidos se formam a partir da identificação de pessoas a partir de um projeto político e ele não é composto só por deputados, vereadores, etc., mas conta com militantes de todas as idades e esses militantes participam com frequência das mais diversas manifestações. Espero que isso ajude a entender a declaração do Movimento Passe Livre (MPL-SP) de que seu movimento é "apartidário mas não contra os partidos". Apartidário por não ser encabeçado por nenhum partido mas por uma causa ou objetivo em comum. Não é contra os partidos pois eles ainda são a base de nossa democracia.
Agora, se você defende o fim dos partidos políticos ou você é anarquista ou você defende o totalitarismo. Senão, está sendo levado pela maré e isso é o mais perigoso. Citando novamente a ditadura civil-militar brasileira, um dos primeiros atos institucionais do governo ditatorial extinguia os partidos políticos existentes e criava apenas dois: a ARENA para quem estava do lado deles e o MDB no qual poderiam permanecer aqueles que topassem fazer uma oposição sem afrontas aos que estavam no poder. Quem não se enquadrasse nesses dois partidos e adotasse uma postura mais radical certamente seria perseguido. Portanto, extinguir os partidos, na minha humilde opinião, não é a solução! Ao contrário, creio que constitui um perigo sério a uma democracia.
Amanhã tem mais...
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