Na postagem anterior, abordei sobre as greves durante o governo de Borges de Medeiros, mas faz-se necessário tratar um pouco sobre a origem da classe operária no Rio Grande do Sul. É importante entender um pouco o conceito de classe operária para compreendê-la melhor.
Segundo o historiador britânico Edward Thompson, "a classe acontece quando alguns homens, como resultado de experiências comuns (herdadas ou partilhadas), sentem e articulam a identidade de seus interesses entre si, e contra outros homens cujos interesses diferem (e geralmente se opõem) dos seus". Ou seja, a classe se dá a partir de uma relação histórica (um resultado de experiências). Assim, ela é inseparável da ideia de "luta de classes", pois as classes não existem como entidades separadas, mas sim num constante processo de luta. E é neste processo de luta que as pessoas "se descobrem como classe e chegam a conhecer este descobrimento como consciência de classe", segundo Thompson. Assim, as classes surgem através da luta, existem porque lutam. A partir desse raciocínio, inferimos que a noção de classe traz em si a ideia de consciência de classe: não se pode atribuir a um grupo esse conceito se ele não possuir essa consciência, nem se ele não agir de uma forma classista. Por isso, só podemos falar de classe operária no Rio Grande do Sul após o desenvolvimento do processo de industrialização e urbanização (final do século XIX).

Ao final do século XIX, os ideais socialistas e anarquistas ganharam força no movimento operário gaúcho. Por aqui, os socialistas tinham uma orientação reformista e não revolucionária, ou seja, organizavam-se partidariamente e queriam tomar o poder pela via eleitoral. Uma de suas máximas era: "A revolução socialista tem por arma principal o voto". Já os anarquistas gaúchos eram como os anarquistas do mundo todo: contra o Estado, recusavam-se a formar um partido e a participar das eleições, sendo sua prática ligada ao sindicalismo (apartidário) como forma de organização dos trabalhadores.
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Capa do Jornal "Echo Operario" de 1º de maio de 1898 |
Um dos marcos na história operária gaúcha foi a realização do Congresso Operário Estadual, de 1898, organizados pelos socialistas, que reuniu associações de trabalhadores de Porto Alegre, Rio Grande, Pelotas, Alegrete, São Leopoldo, Cruz Alta, entre outras cidades. O Congresso, além de revelar o vigor associativo do movimento operário gaúcho, deu início a uma imprensa operária, dedicada à defesa dos interesses dos trabalhadores. Entre os periódicos da época, podemos citar os de cunho socialista - Echo Operário (de Rio Grande) e A Democracia (Porto Alegre) e de tendência anarquista, A Luta, de Porto Alegre.
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Capa do Jornal "A Luta" de 1º de maio de 1909 |
Assim, no início do século XX, o movimento operário já estava organizado e preparado para os inevitáveis confrontos com a classe patronal e com o Estado. A primeira greve geral de Porto Alegre ocorreu em outubro de 1906 reivindicando jornada de trabalho de oito horas diárias e mobilizou, durante 21 dias, cerca de 3,5 mil trabalhadores de diferentes categorias. Um dos principais resultados desse grande movimento grevista foi a a criação da Federação dos Operários do Rio Grande do Sul (FORGS). Com o surgimento da FORGS (1906), o movimento operário gaúcho passou a ser controlado, em maior medida, pelo grupo dos anarquistas, que suplantaram as lideranças socialistas. Os socialistas falharam na formação de um partido sólido no estado e sua mais expressiva liderança - Francisco Xavier da Costa - acabou ingressando no PRR.
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Concentração do movimento grevista na Rua da Praia - Porto Alegre, 1917. |
O início da Primeira Guerra Mundial (1914) agravou a situação econômica do país, trazendo aumento do custo de vida e desemprego. Com isso, a agitação social cresceu e uma série de greves começaram a eclodir por todo o território nacional, das quais uma das mais importantes foi a de 1917. A paralisação começou no final de julho, em Santa Maria, com a greve dos operários da Viação Férrea por aumento salarial e jornada de oito horas. Em pouco tempo, a greve seguiu os trilhos de trem e se estendeu a outras cidades. Em Porto Alegre, a greve foi quase total. Como vimos na postagem anterior, o governo acabou intervindo e algumas das reivindicações foram atendidas, dando fim à greve em agosto.
Nos anos seguintes (1917-1919), uma série de greves gerais eclodiram em todo o estado. Esse foi, também, o período de maior influência dos anarquistas no movimento operário. Depois dessa onda grevista, o predomínio anarquista começou a declinas, mesmo eles tendo continuado no controle da FORGS durante a década de 1920. Na verdade, os anarquistas passaram a sofrer com a concorrência de outras correntes, como a ligada ao Partido Comunista do Brasil (PCB), que atraiu muitos operários com sua promessa de "revolução social".

Para saber um pouco mais sobre a História do Anarquismo no Rio Grande do Sul clique aqui.
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